A minha Cidade
por Jorge C Ferreira
Lisboa, o Bairro de Alvalade, o Palácio dos Coruchéus. Voltar à minha terra. A minha cidade grande. Muito perto a estátua de Santo António, a minha velha escola Eugénio dos Santos, o remodelado cinema Alvalade, a Avenida da Igreja. Os prédios do interior dos bairros são os mesmos. Os prédios de renda de um conto cento e dez.
Depois da apresentação de um livro de contos de Natal da Poética: “Nem sempre os pinheiros são verdes II”, onde tenho uma participação, foi caminhar por aqueles passeios de calçada portuguesa que a minha mulher não gosta e ir até ao Largo de Alvalade. Dois cafés, dois bolos numa esplanada. E a minha querida Lisboa a namorar comigo. Vir à terra onde vi o mundo pela primeira vez é sempre uma festa.
Tanta vida me vem à memória! Tanto jogo de futebol interrompido abruptamente pela polícia! Tanta vaidade passeada pela Avenida de Roma. Lembro-me do Júlio de Matos de portas fechadas e da loucura com as mãos a saírem do gradeamento a pedirem um cigarro. Lembro-me de tudo o que ainda estava por construir. Da vida a crescer. Do Campo Grande. Do velho Estádio de Alvalade.
Tenho a minha cidade mapeada na cabeça. Os lugares da minha vida. A Praça de Londres, a Alameda, o Largo do Leão, a Rua Visconde de Santarém, nº 14, 5º. Dto., o lugar onde nasci. Estava sentado naquela esplanada a ver Lisboa inteira. A minha Lisboa vivida. A Estefânia, a Portugália, a Almirante Reis.
Quando mudei para a velhinha Veiga Beirão, apaixonei-me pelo Chiado, pelo Carmo e pela Trindade. O quiosque e os cigarros comprados avulso. Subir e descer a Garrett. A Calçada do Sacramento e o pão em forno de lenha. Minha escola tão antiga. As igrejas e os cafés. A baixa pombalina. Um outro mundo. Tanta coisa para descobrir. Tanta gente na rua. Tanto homem de chapéu. Tanta mulher aperaltada. As compras. Os grandes armazéns. O cheiro a rio.
Descer ao cais das colunas e provar o Tejo. O barco para Cacilhas. O lado de lá da vida. O fascínio de atravessar aquele estuário imenso. A aventura simples, mas gratificante. O que há para lá de todas as fronteiras. Ter sempre a vontade imensa de conhecer o outro lado. O que há depois de todos os acidentes naturais. Isto para não falar dos malfadados muros que dividem povos e gente que é irmã da gente do outro lado. É tempo de arrasar todos os muros.
Tempo meu, tempo de muitos como eu. Cidade nossa. Cidade que expulsa os seus. A loucura do negócio imobiliário. Uma coisa insustentável a quem ninguém tem coragem de pôr fim. A vergonha dos vistos gold. Alfama despejada dos seus filhos. A cidade mais bonita. Mas para quem? É tempo de acabar com esta ilusão de sermos a cidade desejada. Tudo tem ciclos. Tudo tem um fim, por vezes, doloroso. A agonia da saudade de uma cidade.
Esta é a voz de um lisboeta que se enche de nostalgia sempre que volta à sua cidade. Podem chamar-me “Velho do Restelo”, doido, ou coisas piores. Tudo isto é, no entanto, o que penso. O que faço questão de dizer. Um velho com saudades do prédio onde nasceu e já derrubado. Uma perda imensa. Quase como perder o chão.
Eu sei que as coisas têm de evoluir. Só não concordo, muitas vezes, com a forma como isso acontece.
«Tu já vives nesta terra há tanto tempo e não esqueces Lisboa.»
Fala de Isaurinda.
«E tu, esqueces a tua Ilha? Esqueces a caldeira do Fogo?»
Respondo.
«Nisso tens razão, também não. Somos filhos daqueles lugares.»
De novo Isaurinda e vai, pensativa.
Jorge C Ferreira Dezembro/2022(378)
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Tão belo o que escreveu, sobre Lisboa.
“A cidade da minha vida.”
A voz de um Lisboeta, de um poeta, que apaixonadamente fala da sua e da minha cidade, meu berço. Como tão bem sabe olhá-la e a recorda com nostalgia. Admiro e agradeço, querido poeta. Adorei. Abraço amigo.
Obrigado Maria Luiza. Lisboa será sempre a minha cidade. A sua também minha Amiga. Fiz um breve passeio com os sentimentos à flor da pele. Muito grato pelas suas belas palavras. Abraço enorme
Sei dos lugares que referes, outra luz, outros tempos. A nostalgia da ausência. Lisboa desperta-nos para a vida. Abraço meu Amigo.
Obrigado Regina. Lisboa sempre. Cidade da luz bela. Grato por estares aqui. Abraço grande
Boa tarde, Jorge!
Como eu o compreendo; estamos no mesmo barco da saudade de coisas modificadas ou inexistentes. O progresso modifica tudo para ficar na mesma; sinto essa nostalgia, uma angústia que o tempo não faz esquecer e oprime como garrote!
Um abraço, Jorge!
Bom Ano Novo!
Obrigado António. Saudades do que perdemos e era tão nosso. A minha cidade, o meu berço. A minha gratidão pelo seu comentário. Abraço Enorme
Que bom é viajar, no tempo e aos lugares onde crescemos. Que nostalgia regressar à cidade grande, onde vivi alguns anos. Lembro a Lisboa de finais do 1960 e início de 1970. Os bairros, praças, a Baixa, Avenidas Novas. O som agudo do eléctrico, nos carros.
As pessoas que conheci e fizeram de mim a pessoa que sou.
Obrigada Amigo, por esta viagem a lugares que tanto me dizem. Lisboa sempre Lisboa. O Tejo por companhia.
Grande abraço.
Obrigado Eulália. A cidade que não esquecemos. A cidade branca e pura. Os cafés e os poetas. Lisboa nossa aventura. Grato pelas suas palavras. Abraço enorme
O cronista revisita fisica e mentalmente os lugares da sua cidade. Lisboa. Um mapa de sinapses em que vai construindo quer monumentos quer espaços onde existiu. Cresceu moldado por aquela imensa capital. As suas raízes. A sua identidade.
As boas e as más recordações. As primeiras remetem-nos para a alegria, o conhecimento, o fascínio. As segundas para a mudança deste espaço de eleição ( quem habita agora Lisboa?) . Um sítio impossível para se viver. Um local entregue à riqueza dos euros. E acho que é o que mais lhe dói. Uma nostalgia dorida.
Revolucionário (e revolucionante) o poeta sofre : onde está a gente ” comum”? As pessoas da sua memória? O seu berço? Ali onde se fez homem, na grandeza e riqueza cultural. Ali onde viveu e lutou por uma revolução de liberdade, a todos os níveis e de igualdade para todos. Onde está esse espaço agora? Quem o habita e o alimenta?
Lisboa sinónimo da sua singularidade. As vivências ali concretizadas são o seu património. E como qualquer património deve ser deixado aos semelhantes. Estes em humanidade. E esta foge da capital mãe. Por isso, atrevo-me a dizer que ao cronista dói-lhe Lisboa no presente.
Obrigado Isabel. Brilhante o seu comentário. Sabe bem ler as suas palavras. Lisboa meu eterno berço. A minha gratidão pela sua presença neste espaço. Abraço grande
Maria Matos 26/12/2022. 00:22
Que linda visita a Lisboa….Que recordações lindas!
Que nostalgia… tão linda!
A sua Lisboa!
Obrigado Maria Rosa. Que bom ter aqui a sua presença. Lisboa e este pequeno passeio que fiz pelo seu corpo. A minha gratidão pelas suas palavras. Abraço enorme
Sendo de uma geração diferente, revejo-me em praticamente toda a descrição feita à tua cidade, que também é a minha há mais de 30 anos.
Uma escrita nostálgica que não deixa de me encantar, como sempre.
Abraço
Obrigado Cristina. Que bom estares aqui. Lisboa que passeio num voo de amor. Lisboa minha primera cama, minha luz. Lisboa sempre bela. A minha imensa gratidão pelas tuas palavras. Abraço enorme
Tocante o teu viver na cidade do meu berço.
Parei por segundos em sequências de arruamentos e sorri no recordar de tempos ímpares.
Traças tão bem esse mar de olhares do teu crescer, que em determinados parágrafos … releio-me e sorrio em admiração e estima pela tua “caligrafia” bem apelativa.
Abraço meu grande amigo!
Obrigado José Luís. Meu Amigo, Poeta. Sabe bem ler as linhas que escreves neste espaço. Lisboa cidade nosso berço. Cidade luminosa. O Tejo nossa vida de embarcar. A minha gratidão pelas tuas palavras. Abraço forte
Gostei do que li. O tempo que vivemos é de recordar o que já passou na nossa VIDA. São, quase sempre, as boas recordações que relembramos. E, enquanto acontece, vivemos novamente esses momentos. Beijinhos querido Amigo/Irmão. <3
Obrigado Ivone, minha Amiga/Irmã. Sabe tão bem ler os teus comentários neste espaço. Este foi um passeio nostálgico pela minha Cidade. A minha imensa gratidão pelas tuas palavras. Abraço enorme
Olhei para a escola do Jorge e esqueci me que tinha ido ao colégio dos meus netos.
O relógio do tempo recuou e vejo um menino de cabelo encaracolado pasta de cartão na mão. Vinha a correr ladeira abaixo e entra pela porta principal.
Como era lindo,!
Tirei a foto.desliguei a máquina.
Fui a correr para o espectáculo onde o João ia ler o Poema do seu concurso no colégio.
No final enviei a foto ao Jorge pela net.
Parece-me que o Menino que fotografei não ficou no
retrato.